Falta dialogar com a sociedade, diz ministro
Beto Barata - 13.mar.2015/Folhapress | ||
Ricardo Berzoini, ministro das Comunicações, em Brasília |
Primeiro ministro de Dilma a fazer autocrítica no atual momento de crise, o titular das Comunicações, Ricardo Berzoini, afirma que o governo precisa se comunicar melhor com a sociedade tanto sobre o ajuste fiscal quanto sobre os desafios políticos.
"As pessoas gostam de ouvir a verdade", diz ele em entrevista à Folha.
Sobre a regulação da mídia, projeto dos sonhos de seu partido, o PT, o ministro afirmam que tem uma página em branco. E admite: se levar uma proposta do governo sem consenso com os demais setores envolvidos, o projeto sequer tramitará.
Está fazendo uma autocrítica?
Acho que o governo, no conjunto, e eu me incluo, não fez uma interlocução mais objetiva, o que prejudica a percepção das pessoas do que está em jogo. O Brasil enfrentou durante seis anos uma crise mundial de altíssimo impacto, e apesar disso conseguimos a menor taxa de desemprego da história em dezembro e elevação real de 70% do salário mínimo. Mas, ao mesmo tempo, esgotamos os espaços fiscais. Mas a crise foi muito além. Estamos entrando no sétimo ano de crise internacional. Não quero, no entanto, atribuir somente as nossas dificuldades à crise interna.
Na economia, que autocrítica faz?
Acho que na avaliação da duração da crise e na utilização dos mecanismos anticíclicos, talvez tenhamos ido um pouco além do que era possível, e talvez até aquém do que era necessário. Então agora é hora de reorganizar o orçamento sem prejudicar as políticas sociais fundamentais e sem comprometer os investimentos mais fundamentais. Não é um ajuste do tipo 'para tudo', mas essencial para chegar em 2016 com crescimento significativo.
Na campanha, vocês esconderam da população a real condição da economia?
Não, porque os números da economia são publicados todo mês. E algumas coisas se acirraram nos últimos meses do ano, como preço do petróleo e commodities. Mas nossos programas sociais foram mantidos. Não haverá qualquer tipo de aventura orçamentária. Assim como o fato de haver o ajuste não significa que o orçamento acabou.
O Datafolha trouxe em fevereiro a percepção de que Dilma mentiu na eleição. O que fazer para mudar essa imagem?
As pessoas fazem diferencia aquilo que é necessidade daquilo que é perversidade. Quando a situação é mais difícil, tem que buscar equilibrar as contas. É razoável que as pessoas se sintam preocupadas em relação ao futuro. As pessoas se perguntam sobre o emprego, a renda. A percepção da veracidade do que foi dito na campanha é algo que vai se construir a longo do mandato, não no curto prazo. Não podemos nos preocupar com pesquisas.
O sr. espera reatar com o eleitorado, é isso?
Claro, evidente. Em vários momentos da história do Brasil muitos governos enfrentaram impasses. E a gente supera isso aprovando as medidas do ajuste fiscal, dialogando de forma transparente com a população.
Esse diálogo transparente faltou na campanha. Na campanha vocês diziam que a oposição tiraria o feijão da mesa do trabalhador, faria tarifaço. Hoje, vocês estão aumentando os preços de luz, gasolina.
Não estamos fazendo ruptura com o discurso da campanha. Em crises anteriores, o ajuste era sobre os trabalhadores, a baixa renda e até sobre a classe média. Ficaram seis anos sem reajuste da tabela do Imposto de Renda. Hoje, discutimos se vai ser de 4,5% ou 6,5%. E não acredito em recessão este ano. Temos um momento que vai exigir de nós esforço para convencer as pessoas de que esse é o caminho. É esse o problema que nós tempos até agora, nós não conseguimos realizar uma comunicação eficiente em relação a isso.
De quem é a culpa por comunicar mal?
Nós todos temos responsabilidade de dialogar de maneira franca e transparente com o conjunto dos movimentos sociais, com empresários, com a imprensa, para deixar claro que o esforço que foi feito e que manteve desemprego baixo e renda alta não tem mais espaço para continuar. As pessoas gostam de ouvir a verdade. Como disse a presidente, a gente faz isso em casa e nas empresas.
Para vocês, diálogo franco é dizer das dificuldades atuais. Mas não diz que o ajuste só é desse tamanho por erros lá de trás.
Nós fizemos esforço para manter a atividade econômica. Evidentemente chegamos no limite, que não foi detectado em 2012, 2013. Foi detectado no fim de 2014. A contabilidade pública é transparente. Prestamos contas ao TCU. Não temos como esconder nossas contas de maneira sorrateira. Era necessário fazer para buscar o melhor.
Como a gente sai do buraco?
Com essa estabilidade fiscal, criando condições para que haja credibilidade efetiva de nossa política econômica dentro de um novo viés, que não é mais o anticíclico. Realizar investimentos. Não há nenhuma expectativa de que não haja investimentos. Eles vão ocorrer. O que estamos dimensionando é quanto temos de recursos dentro do que tempos. Não dá para imaginar que o país vai parar de investir este ano.
Manifestações vão crescer?
Isso é futurologia. O Brasil consolidou a cultura de participação pelas redes sociais, que acelera as mobilizações. Não há razão para tratar as manifestações como problema. Quanto mais a gente politizar e mostrar o que está em jogo e o que pode ser feito, é bom.
Mas essas manifestações não são a de junho de 2013. As atuais pedem o impeachment da presidente.
É um discurso golpista porque não haja os pressupostos fundamentais para isso, o que não fortalece a democracia. Não devemos aceitar violência nem a ruptura da ordem institucional. Quando há manifestação a favor ou contra, tempos de respeitar.
Mas com tão pouca popularidade ela não corre o risco de virar um Fernando Haddad?
Eu tenho avaliação que o governo Haddad é um bom governo e que vai buscar diálogo para se fortalecer. Temos que olhar para o longa-metragem que é o mandato, não para o retrato do momento.
A presidente está sitiada no Congresso, tem um processo no STF com políticos investigados. O clima é o pior possível. Como vocês saem disso com todos os astros conspirando contra?
Dialogando, dialogando, dialogando. Esta semana dialogamos e muitos vetos presidenciais que cairiam não caíram.
Quando vai encaminhar o projeto de regulação da mídia?
Abriremos debates públicos no fim do semestre. Vamos abrir diálogo muito amplo e sem prazo para encerrá-lo. Nesse tema, se não afastarmos os mitos e maniqueísmos não iremos a lugar nenhum especialmente numa conjuntura difícil como a que temos hoje. O governo não pode ficar nem surdo a quem diz que não tem que ter mudança nenhuma nem mundo com aqueles que dizem que tem que ter mudança profunda.
Qual a proposta do governo?
Não será o ministério que fará proposta isoladamente. Vamos buscar algum grau de entendimento. Eu diria que hoje ninguém tem hegemonia sobre esse assunto.
Dilma prometeu fazer regulação econômica da mídia.
A leitura que se faz é do monopólio e oligopólios. Vários países têm legislações sobre isso. Como não tenho uma proposta referencial, vou buscar que o debate comece com a cabeça aberta.
O PT é taxado de de querer controlar a mídia.
Injustamente. Não tem proposta de restrição de conteúdo.
Mas é contra a propriedade cruzada, por exemplo.
Não há razão para partirmos de uma opinião de um governo, que não é de um partido só.
Tem que entrar o papel do Google nesse debate?
Tem que discutir o papel da internet, de tudo, empresas de conteúdo. Aquelas que usam a rede e a que faz a infraestrutura da rede.
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