quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Stephanes defende desmatamento zero e ataca países desenvolvidos

Ministro quer mais espaço para agropecuária em áreas já devastadas.
Em entrevista exclusiva, ele responde a perguntas de internautas.

Dennis Barbosa e Iberê Thenório Do Globo Amazônia, em São Paulo


Quanta floresta os agricultores da Amazônia podem desmatar para produzir? O tema gera debates entre produtores rurais e ambientalistas, e também dentro do governo. Os ambientalistas defendem a lei atual: toda propriedade deve ficar com 80% da mata preservada – a chamada reserva legal. Agricultores e pecuaristas acham que é muito. Querem mudar a lei.

Para o ministro, reserva legal deve ser de 50% nas áreas já ocupadas na Amazônia (Foto: Agência Brasil)

No centro da disputa, o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, é enfático ao discordar da regra em vigor. Em janeiro, ele e o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, foram repreendidos pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva após trocarem farpas por causa da revisão do Código Florestal (lei que define quais áreas podem ser usadas para agricultura) e de divergências em relação ao plantio de cana-de-açúcar na Amazônia e no Pantanal.

Nesta entrevista exclusiva, Stephanes responde a perguntas enviadas por internautas. Defende que a reserva legal seja de 50% nas áreas que já estão ocupadas, mas mantendo intactas as florestas que ainda não foram derrubadas. E ataca países desenvolvidos que, para ele, querem obrigar o Brasil a não desmatar, apesar de eles próprios terem devastado suas reservas naturais.

Cerca de 110 perguntas foram enviadas. Para atender ao maior número de leitores, muitas questões foram condensadas. A seguir, a entrevista.

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Lindiane, Fabio Barancelli, Paulo Roberto Berkmann – Qual seria a porcentagem correta para reserva legal (parcela das propriedades rurais que precisa ser mantida com vegetação intacta) na Amazônia? Os 80% no bioma amazônico não inviabilizam qualquer tipo de agricultura?

Sou a favor do desmatamento zero e de uma flexibilização nas áreas já desmatadas, consolidadas. Na Amazônia, temos uma floresta extremamente importante, por um lado, mas, por outro, há uma área já completamente degradada e ocupada. Temos que chegar a uma forma de conseguir o desmatamento zero o mais rápido possível, criando mecanismos para que não aconteça mais devastação e flexibilizando um pouco a área onde já está desmatado, consolidado, para torná-la economicamente viável. E para aqueles que ainda têm direito a desmatar os 20% de suas propriedades, tinham que ser indenizados por esse não-desmatamento.

Valquiria Ferreira Abreu - Seremos nós produtores brasileiros obrigados a pagar pelo desenvolvimento dos países de primeiro mundo que já não têm uma árvore para fazer sombra e querem nos obrigar a sermos o pulmão do mundo?

  • Aspas

    Por que as ONGs holandesas estão no Brasil quando um holandês emite gás de efeito estufa 18 vezes mais do que um brasileiro?"

Os grande poluidores do mundo são os EUA, União Europeia e China. A nossa Amazônia um dia vai desaparecer, não por causa daquilo que nós desmatamos, mas pela poluição gerada por esses países, pelo efeito estufa gerado por eles. A grande pergunta é por que as ONGs holandesas estão no Brasil quando um holandês emite gás de efeito estufa 18 vezes mais do que um brasileiro? Por que a UE critica o Brasil quando nós mantemos 30% das florestas originárias do mundo, e a UE mantém 0,01%, ou seja, desmataram tudo? A pergunta do internauta foi bastante correta: por que temos que pagar esse preço?

Alexandre Frozoni – Pergunto em nome de centenas de pecuaristas que são legítimos possuidores de suas áreas, regularizadas junto ao Ibama e ao Incra: até quando seremos tratados como bandidos e tachados pela sociedade como devastadores da floresta amazônica?

Temos que tomar o cuidado para não transformar o agricultor em criminoso, o que ele não é. Temos que ter o cuidado de atingir aqueles que efetivamente cometem crimes ambientais. De acordo com a legislação ambiental – falando agora do Centro-Sul – um milhão de pequenos e médios agricultores está irregular. E nós não podemos transformá-los em criminosos. Tem que haver mais racionalidade nesse processo.

Silvio Ricardo Carvalho, Carlos Alberto Araújo Júnior – Há alguma maneira de estimular os produtores rurais a preservar as reservas legais de suas propriedades?

Este ano nós criamos pela primeira vez um estímulo: uma linha de financiamento com juros de 6% ao ano, ou seja, praticamente juro zero, pois 6% é a inflação, para recuperação de áreas degradadas de pastagem. Também temos tecnologia para fazer a integração entre lavoura e pastagem, para utilizar melhor essas áreas. Temos que criar uma linha de financiamentos a juros negativos para reflorestamento e a utilização de florestas de forma industrial nas áreas degradadas.

Além disso, temos um programa para o dendê, que seria uma planta extraordinária em determinadas regiões. Já foi feito inclusive o zoneamento das áreas que poderiam ser recuperadas plantando dendê. O dendê para o biodiesel seria melhor do que a soja pois protege o solo e pode ser plantado em chão relativamente fraco, além de ser uma atividade que gera mais empregos.

Alex – Na década de 70, o governo federal incentivava a população a vir para Rondônia e quem não desmatasse perdia sua propriedade. Agora o Ministério do Meio Ambiente quer que aqueles que desmataram 50%, como antes permitia a lei, replantem a floresta, com o que não concordo. O que o senhor acha disso?

Se elas tinham direito de desmatar 50%, não podem ser punidas agora. Se elas tiverem que repor, o Estado tem que indenizar.

Rodrigo Silva – Minha família adquiriu uma área em Careiro da Várzea (AM) que tinha mais de 80% desmatados. O que devo fazer?

Isso teria que ser considerado dentro daquele meu conceito de área consolidada. Essas pessoas provavelmente adquiriram isso de boa-fé, e hoje não têm como sobreviver utilizando apenas 20% da área. Temos que dar condições para que essas pessoas façam o reflorestamento com alguma atividade econômica.

Anderson – O que o senhor acha do corte de crédito aos pecuaristas que não têm licença ambiental? Eles vinham se custeando há anos com esse crédito e do dia para a noite ele é cortado. Queria saber sua opinião.

  • Aspas

    Temos que dar condições para que essas pessoas façam o reflorestamento com alguma atividade econômica. "

Eu fui contra desde o primeiro momento. Porque houve crimes ambientais, puniram-se todos os agricultores de uma região. Aquela portaria envolvia mais de 25 milhões de hectares, ou seja, uma área maior do que o meu estado do Paraná. Acabou-se punindo muita gente, muitos agricultores estabelecidos, que plantam, que estão lá.

Fiz um levantamento no município de Alta Floresta (MT), onde no ano anterior tinham sido concedidos 200 financiamentos do Pronaf (Programa Nacional de Agricultura Familiar), e vi que neste ano tinham sido concedidos cinco financiamentos. Fez-se uma exigência que as pessoas não podem cumprir, que é altamente burocratizada, que é impossível de se tratar a curto prazo. Na minha visão, isso não foi correto.

Fabiano Alex Arnhold – Levando em consideração o avanço das medidas ambientais que protegem a floresta amazônica, qual será a alternativa para os produtores que vivem na região e tiram da pecuária o seu sustento?

Quando falei no plantio de dendê como uma das formas econômicas de ajudar a reflorestar, me refiro a gerar empregos. Se eu utilizar um milhão de hectares para o plantio de dendê –e isso naquela região é uma área até pequena – gero 100 mil empregos diretos, e mais uns 100 mil ou 150 mil indiretos.

Outro exemplo que dou é o das carvoarias. Sobrevoei a região e vi muitas. Vamos lá e destruímos muitas carvoarias e no mês seguinte você sobrevoa, e vê que elas surgiram em outro lugar. Temos que achar uma alternativa. Por que não, em determinadas áreas, se permitir o plantio de florestas para fornecer matéria-prima para essas carvoarias?

Luiz Carlos de Oliveira, Alexandre Giaretta, Arciso Bazanella, Robson Caron da Silva – Como é possível ajudar os pequenos agricultores, os assentados, as pessoas que vivem em locais com pouca infraestrutura?

Evidentemente temos que olhar isso. Essas pessoas estão em grande parte vivendo da derrubada de madeira, porque não têm como sobreviver. Temos que transformá-las menos em desmatadoras e mais em agricultoras. Ali, pelo menos, elas têm que poder utilizar 50% da área, e dar todo apoio técnico para que possam ter uma atividade econômica. Hoje a assistência técnica é muito fraca.

A próxima entrevista interativa do Globo Amazônia será com o ministro do Transportes, Alfredo Nascimento. Mande sua pergunta!

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